artigo-ficção
Liberdade, Igualdade, Fraternidade!
“Olá! O meu nome é Mike. Vivo num bairro no norte de Paris. Os meus pais vieram de outro país viver para a França. O país em que eles nasceram andava em guerra e tiveram que procurar que comer. Mas não foi fácil para eles. Estavam ilegais aqui. No princípio trabalharam em tudo o que aparecia. O meu pai foi para os estaleiros trabalhar com outro amigo. Mas o amigo dele teve um acidente e morreu. E o patrão disse que ele não trabalhava lá. Mais tarde os meus pais acabaram por se legalizar. Mas eu nunca tive um cartão com o meu nome. Depois nasceram os meus irmãos. O dinheiro dos meus pais nunca chegou para termos o que queríamos. Ainda andei numa escola, mas os professores não me ensinavam nada. Diziam que eu e os meus amigos nunca aprenderíamos a língua que se falava em França. E todos ficávamos ao canto da sala. Então desisti da escola. Em casa nunca disse nada porque o meu pai batia-me. Tentei procurar trabalho. Queria ganhar dinheiro para ter as mesmas coisas que os rapazes mais velhos tinham. Usar as mesmas roupas que eles, e não aquele roupa que a minha mãe trazia nem sei de onde. Saí de casa a pedir emprego em vários lados. Mas tinha que ser ilegal, porque ainda não tinha idade. Desisti. Quando andava na rua, todos olhavam para mim. Ou por ter uma cor diferente na pele, ou por estar mal vestido, não sei. Afastavam-se e nunca me davam emprego. Parece que tinham medo de mim. Por isso não podia sair do meu bairro. Os únicos com quem me sentia bem eram os meus amigos da rua. Eles é que me compreendiam. E também eles não se sentiam bem fora do bairro.
Mas à noite era diferente! Saíamos tarde, mas ninguém nos chateava. A cidade era toda nossa. Quase toda!... Andávamos pelas ruas e pelas praças sem problemas. Quando nos cruzávamos com outras pessoas alguém se afastava. Ou os outros ou nós. Tínhamos medo da polícia. Um dos nossos amigos já tinha sido ferido por um polícia. Tirando isso, a rua era nossa. E a noite também. Dormíamos de dia. E, claro, quando víamos coisas boas ao nosso alcance não ficavam lá. Também tínhamos direito a ter alguma coisa nossa. Nós não tínhamos culpa da nossa cor da pele ser diferente ou dos nossos pais não terem dinheiro. Também gostávamos de música, de equipamentos de luta e desporto, etc.
Mas uma noite as coisas correram mal. A polícia apanhou-nos a fazer o que não devíamos fazer e persegui-nos. Éramos muitos e fugimos todos. Cada um correu quanto pode e escondeu-se no primeiro buraco que encontrou. Dois dos meus melhores amigos conseguiram esconder-se no pior lugar possível. Não sei como conseguiram entrar lá. Não se deviam ter escondido naquele sítio, mas se conseguiram é porque não havia protecção. Era um posto de transformação de energia. Morreram os dois electrocutados. Queimados vivos!...
Eram os meus melhores amigos! Ficamos irritados e transtornados! Apetecia-nos fazer o mesmo aos polícias. Queimá-los também! Mas não conseguíamos. Ficamos com tanto ódio que se um carro deles se aproximasse éramos capazes de o destruir. Mas não o fazíamos porque eles estavam sempre armados e nós tínhamos que fugir. Até que um de nós não aguentou. Não aguentou o ódio que sentia. Pela perda dos amigos! Por tudo! E… Como não conseguia incendiar os polícias nem os carros deles, começou a lançar fogo a tudo o que aparecesse…
O resto da história todos sabem, porque os jornais e a televisão falaram disso por todo o mundo!...
Eu agora estou escondido. Pois se os polícias me apanham enviam-me a mim, e talvez a toda a minha família, para o país dos meus pais! Mas eu continuo a pensar que também tenho direito a viver num país rico, e livre, como é a França. Mike”
12 de Novembro de 2005
Sá Lopes
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